Quem já viveu o constrangimento de ver o filho fazer caretas de desagrado diante de um presente sem graça pode imaginar o que seria a vida em sociedade se todos fossem sinceros o tempo inteiro... Um inferno! Nessas horas, o bom senso manda chamar a atenção da criança e mostrar que, às vezes, a verdade causa mágoas desnecessárias. “Não se trata de fazer apologia da dissimulação, mas a mentira social é importante nas relações e ajuda a proteger nossa auto-imagem e a das demais pessoas”, explica a psicóloga Mônica Portella, professora da PUC-RJ e autora do livro Como identificar a mentira (ED. QUALITYMARK). Mas, se em situações específicas essa virtude torta representa um progresso no desenvolvimento da sociabilidade, o uso dela fora desses contextos está longe de trazer benefícios. Ele mina a confiança nos relacionamentos, pode acarretar prejuízos para outras pessoas e alimentar o sentimento de impunidade diante de comportamentos irresponsáveis e pouco éticos. O desafio dos pais é reconhecer essas situações e calibrar as reações, evitando que os filhos caiam tanto no extremo da inconveniência quanto no da “pinoquice”.
Uma verdade só dela
Nos primeiros anos, as mentiras são uma mistura de fantasia e descoberta da independência de pensamento. “A criança gosta de se sentir dona de uma verdade que é só dela. O domínio da linguagem e o pensamento mais articulado permitem inventar histórias mirabolantes, reforçando a percepção de possuir uma consciência autônoma, que ninguém controla. Essas fantasias são um avanço no desenvolvimento mental”, afirma a psicóloga infantil Silvana Rabello, professora da PUC-SP. Outra característica da mentira nessa fase – que dura até 5 ou 6 anos – é a rapidez com que os enredos fantásticos são esquecidos ou substituídos por outros. O objetivo é despertar comoção na platéia ou desviar a atenção de alguma mancada.
Nem por isso as mentiras infantis deixam de causar confusões, como descobriu a vendedora paulistana Andréia Azevedo, 32 anos, mãe de Laura, 4. A filha havia chegado da escola com arranhões no rosto dizendo que tinha sido a professora. “Fui lá conversar e, de cara, a professora quis saber o nome do gato que machucara a Laura. Para a avó, ela contou que havia sido a prima... e até hoje ninguém sabe o que aconteceu. Já pensou se chego na escola fazendo acusações?”, diz a mãe.
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